"A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos." Charles Chaplin

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Dafnee

Dejan Mars estava deitado em sua cama com as mãos em sua barriga e com o olhar fixo no teto. Não fazia idéia de que horas eram, mas a verdade é que ele não conseguia dormir. Havia algo que o estava incomodando muito, algo que ele nunca tinha sentido antes. O silêncio era absoluto e podia sentir o seu coração bater pesado em seu peito, não tinha sido um dia fácil e ficava irritado pelo fato de não poder fazer mais nada. Ele virou de lado e ficou olhando a luz que passava por baixo da porta de seu quarto. Começou a lembrar do dia em que a conheceu, 7 anos atrás. Ele era tão novo, 10 anos, e nunca passou por sua cabeça que um dia essa sua amizade chegaria a isso.

- Você vai pela grade da frente e eu pulo o muro do lado. – falou Luca entre risadas para Dejan, não conseguindo conter o entusiasmo.
- Cuidado para não ser pego. – foi o que conseguiu dizer.
Com os fósforos num bolço, e a caixinha de traques no outro ele pulou no grande quintal da casa desconhecida. Fazia tempo que eles planejavam pegar sua bola, mas tinham medo. Sua Vó sempre dizia “ Não brinquem de bola aqui no quintal porque pode cair na casa do vizinho, e ele é muito bravo. Nunca devolve uma bola!” . Como foram desobedientes, tinham que concertar a situação do jeito deles.
- Ali. Sussurrou Dejan, apontando para a bola. Luca, na ponta dos pés, atravessou o gramado e pegou a bola. Mas então, congelou em seu lugar e o olhou com olhos penetrantes. – Corre! - E saiu correndo para o muro por onde havia entrado.
- Aaai!
- Não reclama menino!
Alguém o puxava pela orelha até o que parecia uma oficina, mas depois viu um portão. Ele segurava com toda força a bola em seu peito, e se sentia humilhado e envergonhado. Nem sabia o que dizer para se desculpar pela invasão, e muito menos queria olhar o terrível homem. O que sua Vó falaria se descobrisse?
O homem chegou na frente do portão de madeira, e com um puxão o fez ficar de frente para ele, ou melhor, para ela. Dejan não conseguiu conter sua surpresa, e soltou um “oh”. Na sua frente estava uma menininha engraçada, de olhos grandes e redondos. Sua pele era clara, e tinha uma cicatriz em sua bochecha. Seu cabelo estava todo despenteado, e ela ficava nas pontas dos pés para falar com ele olhando diretamente em seus olhos.
- O que você tem na cabeça para invadir a minha casa? - Incrivelmente ela parecia muito brava – Da próxima vez é só pedir para eu pegar a sua bola. Então, ela revirou os olhos e resmungou “meninos”.
Foi assim que Dejan Mars conheceu Dafnee, e a partir daí, eles passaram a se ver quase todos os dias.

Ele se mexeu na cama, inquieto. Uma lágrima rolava por seu rosto e um vazio tomou conta de seu interior. Já sentia falta dela. Ele tirou o braço direito de baixo do lençol e começou a mexer em sua aliança. Já sentia falta de suas mãos na dele e de seus braços em volta de seu corpo. Se sentindo fraco, ele fechou os olhos.

A noite estava linda, fresca e silenciosa. Em cima deles as estrelas brilhavam, e a lua os iluminava, mas algo não estava deixando tudo perfeito. Havia alguma coisa com Lisa, mas ele não sabia o que era. Ela não era quieta assim, geralmente ela falava mais do que a boca, e ele gostava disso. Ele era o quieto, e ela a tagarela.
- Dafnee, – ele a puxou para sua frente e segurou suas mãos. Ela fitava o chão. – O que aconteceu?
Lágrimas começaram a rolar por seu rosto, e isso partiu seu coração.
- Dejan, - ela a olhou profundamente e ele pode sentir sua dor – eu fui ao médico e fiz várias consultas, exames, testes, e está confirmado.
- O quê?
Ela suspirou.
- Eu tenho leucemia.
O ar pareceu sumir de seus pulmões e ele não sabia o que fazer. Ele perderia Lisa, aquela que amava.
- Quanto tempo? – ele percebeu um tremor em sua voz.
- Um ano.
Ele começou a chorar e a puxou para seu corpo. Ele a abraçou como nunca, e sentiu, com uma intensidade que nunca tinha sentido antes, que a amava muito, e que era com ela que gostaria de enfrentar o futuro. Ela se afastou se seus braços e passou sua mão em seu rosto.
– Vai ficar tudo bem. Nós vamos aproveitar esse tempo que nos resta não vamos?
Ele estremeceu, ela sempre foi a corajosa.
- Sim, nós vamos.
Então, ele a beijou com todo o seu amor e carinho. Ele a amava.

O telefone tocava. Não queria que tudo acabasse, por isso ficou apenas observando a luz piscar no quarto escuro. Ele sabia que sua mãe estava acordada, e não estava pronto para isso ainda. Esse ano havia passado muito rápido.
- Alo?
Ele fechou os olhos. Por muito tempo havia sonhado com esse dia, e dês da hora que saíra do hospital sabia que havia algo estranho no ar.
- Ai, falo sim. – Sua mãe começou a chorar. – Meus pêsames.
Ouviu o telefone desligar, e ficou ouvindo os soluços de sua mãe ali perto. Sentindo a força que julgava ter acabado fazia tempo, abriu a porta do quarto e caminhou até sua mãe, e abraçado a ela deixou sair tudo o que havia segurado ao longo do ano. Dafnee se fora.

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